sábado, 3 de novembro de 2012

Malandro é malandro, mané é mané




A voz do morro tem vários intérpretes. A plêiade é extensa. Mas no imaginário de cada um, existem aqueles mais marcantes por alguma excepcionalidade em sua performance musical. Da Velha Guarda, lá dos idos do "desde que o samba é samba", até os bambas da nova geração, que se misturam a artistas de outros gêneros como funk e o pagode, a Rádio Favela irradia sua criação para a cidade.

Entre o morro e a cidade, ainda há uma barreira social e cultural imensa, mesmo que as pacificações/ocupações tentem fazer o contrário. O Estado não consegue mais reverter o preconceito que ele mesmo criou ao empurrar, para longe das vistas de um ideal de urbanidade, os sem-teto, os sem-asfalto.  

Bezerra da Silva tem lugar destacado, ao lado de Cartola, entre os meus sambistas preferidos. Dois artistas de estilos diferentes na dicção do samba carioca, mas iguais no papel de mediadores entre realidades materiais e simbólicas antagônicas. O último, de lirismo apaixonado e saudosista; o primeiro, de verve debochada e realista.

E é sobre Bezerra da Silva, ou melhor, sobre os compositores de seus vários sucessos que o documentário "Onde a coruja dorme" retrata. Falecido em 2005, Bezerra era um "malandro do samba", pois sabia identificar, pelo piá da coruja onde o melhor do samba se escondia. Ali, de sua toca, com seus olhos e ouvidos sensíveis, a coruja está sempre atenta ao que passa a seu redor, volteando seu pescoço a cada ruído  ou movimento.

A coruja em narrativas mitológicas representa a sabedoria, e não à toa, a coruja pia em suas letras um tipo de filosofia que não precisa de escola ou academia para ser um pensamento verdadeiro sobre a malandragem.