sábado, 29 de janeiro de 2011

Rota do Açúcar - Pernambuco, parte 2


Engenho Uruaé, Goiana, Pernambuco



Engenho Cueirinhas, Vicência, Pernambuco



Engenho Várzea Grande, Vicência, Pernambuco



Vista da varanda da casa-grande do Engenho Poço Comprido para a moita, à esquerda


Capela e casa-grande do Engenho Poço Comprido, Vicência, Pernambuco




Ao pegar a estrada para a Zona da Mata pernambucana, a pretensão era seguir até Goiana, dormir lá e descer direto para o norte de Alagoas e conhecer Maragoji, onde está a Fazenda Marrecas.

A primeira cidade foi Nazaré da Mata, a Terra do Maracatu Rural, maior manifestação cultural do Carnaval de Pernambuco. Esta é minha opinião. O frevo é mais forte em Recife e Olinda, mas o maracatu é o que de fato dá o tom da beleza cênica e performática da festa no Estado, além de religiosa e simbólica. Sem maracatu, não tem folia.

Ao chegar, fui logo conhecer o Parque dos Lanceiros, na entrada da cidade, onde tive a sorte de conversar com o Mestre Barachinha, que me informou tudo o que pôde contar no pouco tempo que eu tinha. Já era quase meio-dia e eu ainda precisava visitar três engenhos. A chuva era um impeditivo a mais.

No museu do Parque, visitei uma pequena exposição permanente de objetos e adereços de maracatus, assim como painéis informativos sobre os grupos. Mestre Barachinha, muito atencioso e bem informado, deu uma aula de cultura popular.

O Engenho Cueirinhas foi transformado em hotel-fazenda, com uma estrutura muito bem construída, além da casa-grande, que é o único prédio original da propriedade. A capela foi levantada depois, assim como a casa do administrador.

A dona Leonor mantém sozinha o engenho, depois que seu marido faleceu. No momento da visita, ela não estava, mas autorizou que seu caseiro, Nido, me guiasse por onde eu quisesse. E assim, fizemos. Encantei-me com a preocupação dos proprietários em manter a ambiência de uma casa antiga ao reconstituir com móveis e objetos a decoração dos cômodos.

Fiquei com vontade de passar um fim-de-semana no Engenho, que tem opções de lazer típicas de um hotel-fazenda. As refeições são servidas num imenso galpão, outrora estrebaria, e que pela gradiosidade da mesa, a comida não deve se pouca.

Como fica na beira da rodovia, numa elevação entre várias árvores, não deu para fotografar a sua fachada inteira, mas a foto da varanda dá a idéia da amplitude de sua arquitetura. Não é um dos maiores, mas toda casa-grande é simbólica e materialmente a maior casa de um engenho, assim, me senti num palacete.

No caminho para Vicência, passei pelo Engenho Várzea Grande, e como sempre, me encantei com a preservação das construções, pelo menos externamente. Neste caso, da própria casa-grande e da capela, além de verificar a existência de prédios não comuns em engenhos do século XIX, como padaria e oficina, o que indica de que houve adaptações ao longo do século XX.

Não pude entrar, pois é propriedade particular e, portanto, não tinha pedido autorização. Nem pude negociar com o caseiro uma espiadela mais de perto na casa. As fotos tiradas do lado de fora estão boas e matou minha vontade.

A partir daí, virei caçador de engenho. Tudo que era construção à beira da estrada na qual eu via uma torre, eu parava e perguntava a quem estivesse perto. Muitas só tinham mesmo a torre, mais nada, ou então ruínas irreconhecíveis de antigas moitas.

Em Vicência, minha aventura foi feita lama adentro até chegar no Engenho Poço Comprido, o único engenho tombado pelo IPHAN, segundo Jane, diretora de cultura e da associação que preserva o patrimônio artístico-cultural da cidade.

De fato, vendo o trabalho de restauração do engenho, entendi o porquê de tamanho cuidado com esse engenho. A visita foi muito bem guiada por Jane, que de forma bem didática, me explicou passo a passo a trajetória do engenho.

Embora esteja em terras de uma usina, inclusive há uma vila de trabalhadores no entorno do antigo engenho, existe uma abertura para que projetos viabilizem a manutenção do complexo.

Algumas curiosidades dão ao Poço Comprido uma beleza especial. Primeiro, é um dos poucos engenhos, cuja casa-grande tem um passadiço ligando-o à capela. Na verdade, ambos eram afastados, mas com as sucessivas reformas, os proprietários foram estendendo para os lados, a ponto de anexar prédios dispersos. A cozinha foi também um deles.

Outro detalhe, é que o prédio foi construído em taipa, o que demonstra a rusticidade da casa-grande, diferentemente das casas da Zona da Mata sul, que por pertencerem à Capitania de Pernambuco, mais rica do que a de Itamaracá, foram mais elaborada, do ponto de vista dos detalhes.

Passei uma hora imerso na vida do Engenho Poço Comprido. Da varanda, pode-se constatar o que é comentado em diversos textos. Ou seja, quanto mais elevada era a casa-grande, mas se tinha a certeza de posse, porque a certeza de ser dono tinha que estar à sua frente, visível.

Na mesma estrada que dá no Poço Comprido, tem mais adiante o Iguape, que já virou autosustentável por explorar o espaço para hospedagem. A tarde estava caindo e eu precisava ainda chegar à Goiana.

O dia foi muito produtivo. Ou melhor, todos os dias têm sido ricos em descobertas. Inclusive, de mudanças de destinos. Em Goiana, como não consegui encontrar o Engenho Uruaé, decidi retornar à Recife, mas no meio do caminho vi a placa para João Pessoa.

Abri mão de dois dias que perderia em Alagoas para rever os amigos em Jampa. Esse capítulo não entra.

Só no retorno para Recife, foi que conheci o Engenho Uruaé, a poucos quilômetros do centro de Goiana.

No próximo post, volto a falar sobre Alagoas.


sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Rota do Açúcar - Pernambuco, parte 1




Mirante de Vila Velha, antiga sede de Itamaracá, para o canal que divide a ilha do continente.

Os primeiros engenhos visitados nesta viagem pela Rota do Açúcar foram os de Pernambuco, especialmente de quatro cidades: Igarassu, Itamaracá, Nazaré da Mata e Vicência. Como decidi começar por esse Estado, tive que dividir em dois roteiros. No primeiro dia, Igarassu e Itamaracá por serem cidades próximas a Recife; no segundo dia, Nazaré da Mata e Vicência. Goiana estava também no roteiro, mas houve uma mudança no plano de vôo e, em vez de pernoitar na cidade e na manhã seguinte visitar o Engenho Uraié, fui para João Pessoa por estar à meia hora de distância e por ser a capital de que mais gosto entre as da Rota. Como expliquei no post anterior, os engenhos da Paraíba serão visitados noutro momento.
Antes de ir para Igarassu e Itamaracá, eu passei no Museu Gilberto Freyre, em Apipucos, a casa onde o escritor viveu por mais de 30 anos, ela mesma uma das casas-grande do antigo Engenho dos Irmãos. É uma bela quinta, que fica numa elevação e vizinha ao Convento dos Maristas. Aparentemente é grande, devido ao fronstispício largo e alto, mas tem as dimensões mesmas de uma residência de temporada de seus ex-proprietários. Segundo a guia, a estudante de História, Helga, a casa passou a ter status de principal, devido às enchentes do rio que margeava a casa-grande maior tê-la inundado. É proibido filmar e fotografar no interior do museu, no entanto, as informações da guia valeram mais do que rolos de filmes.
Em Itamaracá, só existia no roteiro o Engenho São João. Ele fica às margens da rodovia estadual que liga a ilha ao continente. Embora sob responsabilidade da FUNDARPE, órgão do governo do Estado de patrimônio histórico, o engenho não tem guia para acompanhar os visitantes, apenas um zelador que não tem muitas informações a dar. O que mais chama à atenção é o prédio da moita, onde ainda se vê o maquinário a vapor, o primeiro a ser usado em engenho pernambucano. A área do engenho, que compreende de casa de farinha, posto de saúde e ruínas da casa do administrador, é usada como colônia agrícola para ressocialização de detentos.
Para chegar à ilha, temos que passar por Igarassu, que tem um centro histórico bem conservado, cujos prédios avultam quando se chega na zona central da cidade, principalmente o conjunto do convento, igrejas e paço municipal, além do casario nas imediações.
Em Igarassu, tem dois engenhos listados. O Munjope é o mais importante em termos de arquitetura de Pernambuco, segundo o historiador Roberto Carneiro, da FUNDARPE, com quem mantive contato, e fica na BR 101, retornando para Recife. Mas eu não pude visitá-lo, porque errei o caminho e, como já estava anoitecendo, não queria arriscar.
A importância do Munjope, deve-se a preservação original de seu conjunto, ou seja, casa-grande, capela, moita e senzala, diferentemente dos outros que não tem todos esses prédios. Mesmo que eu acertasse o caminho, não poderia entrar, pois precisa de autorização da FUNDARPE. Ele está sendo reformado e, enquanto estiver nesse processo, não é liberada a visitação, no entanto, o historiador disse que poderia abrir uma exceção para mim.
Planejei visitá-lo no retorno de Goiana, pela mesma BR 101, quando fizesse a rota dos engenhos da zona da mata, na quinta, dia 27, mas não o fiz, porque ao chegar em Goiana, no limite com a Paraíba, na quarta, 26, decidi mudar a rota e visitar João Pessoa.
No próximo post, falarei sobre os engenhos de Vicência e Nazaré da Mata.

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Engenhos literários e sentimentais


Logo do Roteiro Integrado da Civilização da Açúcar



O começo da viagem na divisa da Bahia com Sergipe.
Até Recife, foi muito chão, chuva e chocolate, para distrair a boca e dá energia.




Fundação Gilberto Freyre, em Apipucos, Recife, casa-grande onde ele morou, o qual escreveu vários textos sobre a "civilização do açúcar". Lugar belíssimo e inspirador.


Desde sábado, estou viajando de carro pela Rota do Açúcar, ou como institucionalmente o Ministério do Turismo denominou de Roteiro Integrado da Civilização do Açúcar, um produto turístico que visa a diversificar as opções de visitação ao Nordeste, incluindo o interior.

Este projeto engloba os engenhos e usinas de açúcar de Alagoas, Pernambuco e Paraíba, no qual mostra a arquitetura e a memória cultural das cidades e comunidades que surgiram a partir do plantio da cana e da produção de seus derivados, como açúcar, cachaça, álcool e rapadura.

Antes da integração dos Estados em consolidar este produto que, se não é inovador, é rico em opções, eu já me interessava, mesmo que com pouca dedicação de pesquisa, às referências desta cultura do açúcar nas obras de autores nordestinos, como José Lins do Rego, Gilberto Freyre, João Cabral de Melo Neto, Jorge de Lima, José Américo de Almeida, Graciliano Ramos etc.

Agora, decidi unir lazer e trabalho nessas férias para realizar esta viagem de mapeamento pelos engenhos listados no Roteiro. Como o tempo é pouco para percorrer todos as cidades, fiz um recorte geográfico para Alagoas e Pernambuco neste primeiro momento.

É a rota mais rápida, devido à proximidade entre as capitais e os engenhos. A Paraíba foi o primeiro Estado a fazer seu próprio roteiro, já consolidado com produtos diferenciados, como festas populares e degustação de bebidas nas cachaçarias do Brejo, onde se localizam as cidades de Areia, Bananeiras e Serraria. Este roteiro, pretendo fazer na segunda excursão.

Meu projeto se chama "Engenhos Literários e Sentimentais" e deverá ser um documentário de longa-metragem, para 0 qual devo captar recursos e começar as filmagens ainda neste ano. É uma idéia original, cujo interesse tem despertado a atenção de profissionais ligados ao patrimônio histórico e ao turismo. O contato com os gestores nessas áreas têm sido muito proveitoso, pois precisarei de seus conhecimentos para preparar o roteiro audiovisual, inclusive com gravação de seus depoimentos.

Nesta viagem, eu vou fazer o caminho inverso. Segui direto até Recife, com parada em Maceió para pernoite no sábado. Em Pernambuco, devo ficar três dias. Hoje, visitei Igarassu e Itamaracá. Terça, vou mais longe: Nazaré da Mata, Vicência e Goiana. Retorno quarta para Recife e sigo noutro dia para Alagoas, onde começo por Maragoji (norte) até Coruripe (sul). Pretendo chegar a Salvador na segunda-feira, dia 30.

Está sendo uma aventura com sabor de rapadura e talagada de cachaça, tudo isso com moderação, senão dá dor de barriga e embebeda, e ficar indisposto e não poder dirigir é perder o bom da viagem, a descoberta de lugares desconhecidos.