terça-feira, 3 de novembro de 2009

O Iraque é aqui!

Gays enforcados no Iraque: homofobia mata

Depois de uma Parada Gay animada no dia 25 outubro, onde e quando todos e todas deram pinta sem o olhar de reprovação dos moralistas de plantão, nem o cacetete da repressão policial, eis que na semana seguinte um crime mancha a bandeira colorida com o sangue da intolerância.

A brutalidade com que foi assassinado Jorge Pedra, jornalista e apresentador de programa na Tv Salvador, é capaz de nos deixar impactados, mas não impassíveis. O Grupo Gay da Bahia bradou e a Prefeitura já autuou três hotéis que na verdade funcionavam como motéis e não registravam os hóspedes.

A lista de homossexuais mortos por homícidio ou latrocínio na Bahia já chega a quase vinte desde o início do ano, muitas vezes sem a prisão dos criminosos e que podem estar à solta, caçando mais um gay para o deleite de sua mente doentia.

Os comentários do público nas ruas e de leitores nas matérias dos jornais locais apontam o jornalista como o culpado pela própria morte. Isso não resolve o caso, mesmo que o assassino seja preso e confesse o crime, porque Jorge não estará vivo para se defender do preconceito e da homofobia. A violência anti-homossexual já é um caso de segurança pública nacional.

Escolher bem seus parceiros sexuais não é garantia de vida. É certo que o garoto de programa já foi para o hotel com a intenção de roubar ou/e matar, mas quantos crimes passionais entre heterossexuais e mesmo entre gays casados de longo relacionamento estampam as páginas policiais?

Por sinal, noticia-se mais casos de mortes entre heteros do que entre homossexuais, pelo fato mesmo de a família e amigos de muitos gays não-assumidos ocultarem a motivação do crime para preservar a honra de todos.

A ousadia de um gay não é a mesma de um hetero. Ela é mais arriscada, porque numa sociedade machista e homofóbica não lhe é dada concessão sem que não haja humilhação e discriminação. Isso antes, durante e depois de ser morto. Tratamento de expurgação sexual e limpeza social.

Neste caso de Jorge Pedra, sendo ele cliente assíduo do hotel onde morreu, a recepção não se preocupou em registrar o nome do homem que o acompanhava. Sendo VIP, merecia segurança e atenção do estabelecimento, mas assim como o michê, o gerente do Democrata só tinha interesse no dinheiro de Jorge. Era certo.

Depois de consumado o crime, os reais que Jorge ganhava para mostrar caras e bocas de gente do high society baiano não valeram os minutos de fama e sucesso, não por acaso nome de seu programa, que ele teve nos Se Liga Bocão e Na Mira da televisão como mais uma "bicha morta". Só a família e poucos amigos compareceram ao enterro. Ricos e famosos sumiram.

Preocupa-me muito a imagem de permissividade sexual em Salvador divulgada entre os gays brasileiros e estrangeiros. Aqui todo mundo gosta do babado e faz sem comedimento. É esta a ideia que se tem dos homossexuais (e heteros) baianos, mas não se atentam para o 1º lugar ocupado pela Bahia em mortes por homofobia. Se há ligação direta entre uma coisa e outra, não é possível afirmar, mas que aqui a caça e o abate de "viado" são recorrentes, não tenho dúvidas.

No Iraque, segundo relatório mais recente do Human Rights, homossexuais são perseguidos e exterminados por extremistas religiosos. Os corpos são jogados no lixo com inscrição de "pervertidos" no peito ou enforcados e expostos em praça pública. Adolf Hitler perseguiu judeus homossexuais, que eram identificados nos campos de concentração com um triângulo rosa na roupa. Estima-se que 50.000 foram presos e 10.000 foram mortos.

Esperar pela prisão do assassino de Jorge Pedra e ouvirmos ele falar que matou porque o jornalista queria que ele fosse passivo, como justificou sua defesa o homicida do irmão do humorista Cláudio Manoel, do Casseta e Planeta, em 2007, é jogar para a vítima mais uma vez a responsabilidade e, assim, fazer crer que a masculinidade é intocável e inatacável. Será que o cara é menos gay se for ativo? Tem gente por aí pensando assim, mas o que o dinheiro não faz, inclusive matar, para que o machão não perca sua hombridade?

O assassino de Jorge Pedra agora é mais caça do que caçador. Seu rastro está sendo seguido. E o bicho será enjaulado. A Polícia tem a obrigação de fazer isso. E nós, heteros, bi, homo, trans, o que faremos para que a intolerância não transforme nossos desejos sexuais em mais uma estatística mortal? Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é, como diz Caetano Veloso, mas ninguém é obrigado a pagar pelo sentimento de culpa do outro.

Não à homofobia. Criminalização já.

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